sábado, 22 de maio de 2010

Discurso (AAM)

A convite da AAM – Associação Amigos de Murça, foi-me dada a honra de evocar a “Vida Civil “do Herói Aníbal Augusto Milhões no após-guerra 1914-1918.
O seu apelido de baptismo era Milhais mas adotou o de Milhões porque assim foi crismado quando o seu Comandante, Major Ferreira do Amaral, pronunciou a frase célebre: Tu és Milhais mas vales Milhões. Depois da guerra, em 1919 o Milhões foi viver para a sua terra, Valongo, e continuar a vida na agricultura como sempre o fizera. Casou com Teresa de Jesus dos Santos e teve 10 filhos:
Três que morreram novos um deles 1º. Cabo da Força Aérea, num acidente de moto; duas meninas professoras e cinco rapazes. Conheci bem o senhor Augusto Milhões e seus filhos, quase todos caçadores,com quem eu e meu pai caçamos algumas vezes. Além disso, nos meados do século passado, era eu funcionário da Camara, quem preenchia a folha da sua pensão (28$20) e tratava das licenças de caça e de uso e porte de arma de todos eles.
Por este homem, pequeno de corpo mas de coração enorme, tive sempre uma grande admiração desde a primeira hora em que falei com ele. Impressionou-me o seu olhar profundo, vivo e transparente e límpido como a água da ribeira que corre junto da sua casa. O seu sorriso era o de uma criança feliz a quem dão brinquedo dos seus sonhos.
O Milhões, - perdoem-me que o trate assim -, apesar de viver satisfeito amanhando as suas pequenas leiras onde colhia batatas, centeio, milho, hortaliças, vinho, etc, não era totalmente feliz, porque não conseguia juntar dinheiro para construir uma casa..., o seu sonho, resolvendo por isso, em 1928 emigrar para o Brasil, em busca da árvore das patacas que não chegou a abanar porque a colónia de emigrantes portugueses condoída e revoltada, por ver um dos filhos diletos da sua Pátria, ter que emigrar para conseguir dinheiro para construir uma casa, arranjou-lhe 18.000$00 com que pôde regressar à sua aldeia e concretizar o seu sonho, com o produto da subscrição que o Diário de Lisboa promoveu, aquando da sua ida àquela cidade, numas comemorações de homenagem Nacional.
Recentemente, em conversa com um seu filho de nome Norberto, tive conhecimento de alguns episódios da sua vida, que constituem dados bem curiosos da sua biografia.

Referi atrás que os Milhões eram uma família de caçadores e bons, mas o Milhões, pai, gostava mais de caçar à espera e era por isso que tinha sempre sorte quando dizia à mulher: Teresa, põe a panela ao lume que eu vou ali matar umas perdizes e já venho... e assim acontecia, porque ele sabia onde as encontrar.

O Aníbal Milhões era o protótipo do lavrador transmontano, honesto, franco, hospitaleiro e generoso.


SOLDADO HERÓI MILHÕES:


Dizia-se que a sua casa era um autentico albergue que acolhia toda a gente necessitada ou em dificuldades: Ciganos, caldeireiros, pobres de porta, doentes, etc, e que tinha mais de 50 afilhados, dessa gente que não arranjava quem lhe apadrinhasse os filhos.
Alegre e divertido -” um pandego” no dizer do filho Norberto - tocava realejo com que animava os bailaricos da juventude da aldeia a começar pelos filhos em casa, à lareira, janeiras ,e gostava de se meter com as moças...
Contava anedotas e histórias que -dizia- aprendera na guerra e apreciava a “pinga de estalo ”, das suas videiras, dizendo: eu gosto de vinho mas também sei tratar das videiras... e era verdade, porque até conhecia as castas pelas cepas, sendo muito disputado pelos viticultores do concelho.
Fumava cigarros de onça e murtalha que fazia com perícia.

O Milhões que, a partir de 1966 passou a ganhar tanto como um professor, mil e poucos escudos, começou por auferir 28$20 pensão a que tinha direito pela condecoração da Ordem de Torre e Espada.
Antes de terminar, lembro o episódio que ocorreu aquando das comemorações Nacionais do 9 de Abril em Lisboa. No Gabinete do então Presidente da República António José de Almeida que, ao ser-lhe por ele perguntado se gostaria de guardar a sua metralhadora, lhe respondeu “não quero...essa menina conheço-a eu muito bem”... Consta que, para o homenagear, o Dr. António José de Almeida tirou do dedo um seu anel e lho ofereceu.

Em 3 de Junho de 1970, com 75 anos de idade, morreu e foi sepultado na sua terra o soldado mais condecorado do Exército Português.
Em 2 de Outubro de 1972 a Camara Municipal de Murça perpectuou-lhe a memória erigindo nesta praceta com o seu nome o busto, em bronze, que temos à nossa frente.

Obrigado

M FREITAS
10/04/2010

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